BOLETIM

Saiba as novidades do site.

Seu e-mail:

 

SUAS CAPACIDADES

Comparação

Uma capacidade inata que pode ser origem de dor ou prazer

Como é que você sabe que algo é "bom", está "certo" ou não? Como é que você reconhece uma pessoa? Como é que você sabe que atingiu um objetivo? Para conseguir fazer todas essas coisas e muitas mais, você precisa usar uma capacidade de pensamento que vem do berço: a comparação. Nesta matéria você vai ver como essa habilidade influencia a suA vida e como usá-la melhor.

Sumário

Percepções

Riscos e problemas

Aplicações

Benefícios

Interferências 

Indo além

Percepções

Quando você passa por alguém na rua, precisa fazer uma verificação: é um conhecido? Como você sabe se já viu alguém? Parece óbvio que deve comparar a percepção atual do rosto com as imagens de rostos armazenadas na sua memória. Uma evidência disso é quando a pessoa não é reconhecida, mas se parece com alguém conhecido; muitas pessoas comentam como ele se parece com alguém: o cérebro, quando não encontra um conhecido, retorna um semelhante. Outra evidência da comparação é que, no caso de um conhecido, se seu rosto ou corpo está mais cheio, ou se está abatido, você percebe as diferenças. Isso quer dizer que, no nível subconsciente, sua habilidade de comparar é capaz de perceber diferenças mínimas nos contornos da pessoa ou em detalhes sutis de sua aparência. Tendo em vista a quantidade de pessoas que você conhece e que você faz isso mais rapidamente que um piscar de olhos, essa etapa de comparação é executada de maneira incrivelmente veloz.

Mais exemplos. Se você está martelando um prego, como sabe que já terminou? É porque mantém internamente uma imagem de como quer o prego, e vai martelando. Quando a situação percebida, ou seja, "lá de fora", estiver igual à que pretende, então você pára. Se o prego vai prender algo em madeira, você o quer enterrado. Se for para segurar um quadro, vai deixar uma sobra. Em ambos os casos, você compara a situação que percebe com a desejada, e age enquanto esta não é realizada. Também nesse caso a capacidade de comparar é insubstituível.

Agora pense em duas viagens de férias que fez; de qual gostou mais? Pense também em dois prazeres que sentiu e diga qual foi o melhor. Para fazer isso você precisa acessar lembranças das férias ou dos prazeres e... compará-las, é claro.

E como você sabe que uma pessoa é "bonita"? Comparando com imagens de referência de beleza. Como sabe que um instrumento ou voz está afinado? Comparando com a afinação correta. De passagem, vale comentar que, no caso da beleza, sua percepção não é estável e rígida; basta lembrar-se de uma pessoa ou uma música que a princípio não achou bonita e depois passou a achar.

Mesmo as sensações podem ter elementos de comparação; quando você toma limonada e depois come um doce, sua percepção deste muda, não? Outra evidência disso é a clássica experiência de por a mão esquerda em água quente, a mão direita em água fria e depois ambas em água morna: as sensações de cada mão na água morna são diferentes.

E até as noções de lentidão e rapidez podem ser resultado de comparações. Você já fez uma viagem de 2 horas seguida de outra de 6? E uma que durou 9 horas, seguida de outra que durou as mesmas 6? Qual das que duraram 6 horas lhe pareceu mais "rápida"?

Uma pessoa com roupa branca parece mais morena; um novo videogame ou computador pode tornar o que temos "ruim". Os exemplos podem prosseguir indefinidamente, mas creio que ficou demonstrado que a capacidade de comparar é um processo que você e eu usamos todo o tempo, e o fazemos a uma velocidade tão grande que pode tornar o processo inconsciente. 

Em geral, todo processo de comparação que fazemos tem pelo menos a coisa comparada e a referência de comparação. Por exemplo, se você se compara com uma pessoa em altura, a referência de comparação é a altura da outra pessoa. Uma referência pode ser um rosto, um sabor, um som, um nariz, comportamentos específicos e o que quer que você possa distingüir.

Mas será que são só benefícios o que obtemos ao fazer comparações?

Riscos e problemas

Muitas vezes fazemos avaliação do nosso desempenho: fui bem? O resultado desse tipo de comparação pode nos animar ou não. Mas qual foi a referência da comparação? Se alguém prepara um almoço, para avaliar se está bom, pode ter várias referências: o melhor que já fez, o melhor que já comeu, sua própria expectativa de qual era a comida que pretendia fazer.

Um exemplo pessoal. Eu escrevi e reestruturei uma apostila de programação de computadores, de mais de 200 páginas, oito vezes e não fiquei satisfeito. Ao aprender sobre como eu fazia avaliações, descobri que sempre que terminava uma versão tinha várias idéias para melhorar o material, e essas idéias não podiam ser inseridas devido ao final do prazo, o início do semestre letivo. Como minha referência de comparação era a apostila - melhor - que eu tinha na minha mente, o resultado foi que eu via de regra julgava a apostila "ruim" ou não boa o bastante. E isso acontecia mesmo recebendo bons feedbacks dos estudantes sobre a dita cuja.

Há pessoas que, para saber se o que obtiveram está bom ou não, sempre comparam com o melhor que já fizeram antes. Por exemplo, uma mulher tem orgasmos múltiplos com um homem; na próxima vez, este pode ter a expectativa de que ela os tenha de novo; se isso não ocorrer, foi "ruim".  A comparação também pode ter como referência a intensidade de um orgasmo anterior. Isso pode ocorrer com passeios, filmes, sorvetes e todo tipo de coisa.

Uma pesssoa pode até, por exemplo, ficar deprimida por não conseguir avançar na resolução de um problema, resultado direto da referência de comparação que ela está adotando. De maneira geral, muitas emoções são resultado de comparações.

Assim, uma comparação pode ou não ser útil para o que pretendemos, pode ser melhor ou pior conforme o caso. 

Aplicações

Idéias são boas mesmo quando podemos e sabemos aplicá-las no dia a dia; esta seção apresenta algumas possibilidades. Antes de procurar aplicá-las, porém, verifique suas estratégias de pensamento, pode ser que você já esteja usando bem as comparações e não está tendo consciência disso!

Para usar as percepções acima em nosso benefício, vejo duas formas: não comparar, quando isso for útil, ou distinguir que estamos comparando e qual é a referência de comparação, modificando-a quando for o caso. 

A opção de não comparar pode não ser tão fácil no início, porque as comparações fazem parte de "programas" muito bem instalados na nossa mente, tão bem que os executamos rapida e subconscientemente. Um ponto de partida para evitar comparações pode ser trazer a atenção para o momento presente e avaliar o que está acontecendo no agora: O que estou vendo? O que estou sentindo? 

Já alterar a referência de comparação pode ser mais acessível: basta direcionar a atenção para o processo de pensamento, assim como um observador, possivelmente utilizando o poder provocador e direcionador das perguntas: "Com o que estou comparando?". 

No caso da apostila citado acima, ao tomar consciência do que estava fazendo internamente e da referência de comparação, pude reavaliar a qualidade do trabalho por outro enfoque. E mais, descobri a possibilidade de ter várias referências de comparação e escolher a mais apropriada.

Veja abaixo alguns exemplos de contextos de aplicação dessas sugestões:

- Em uma viagem, conscientemente lembrar (e enfatizar) a viagem mais longa que já fez, para tornar a atual mais tolerável.

- Ao agir em direção a algum objetivo, comparar a situação atual com o que se quer (o que falta) e também com o que já foi obtido. 

- Em uma relação sexual, prestar atenção às sensações e avaliar se são agradáveis por si, ao invés de verificar o quanto falta para algo acontecer (orgasmos são subprodutos, não são obtidos diretamente). 

- Ao comer um estrogonofe que não é o melhor que já se comeu, concentrar a atenção nas sensações que está se tendo, isto é, buscar sentir prazer a partir das sensações e não da comparação. Isso vale para prazeres sensoriais em geral.

Uma outra linha de aplicações dessas idéias envolve lidar com a referência de comparação de outras pessoas. Considere o preço de um produto; "caro" e "barato" são noções derivadas de comparações. Certos vendedores fornecem a referência de comparação antes que usemos a nossa, como aconteceu em uma feira: o vendedor me ofereceu um produto cujo preço "normal" era $230 e excepcionalmente, naquela feira, poderia ser adquirido por "somente" $170. 

Em outro caso que ouvi, o esposo colocava a música bem alto; a esposa reclamava, e ele então abaixava o volume para o que ele efetivamente queria!

E se você avalia se é feliz ou não com base em comparações, pode ir até um asilo ou instituição que cuida de deficientes dar uma voltinha...

Benefícios

O que esperar de investir tempo no aperfeiçoamento das comparações que fazemos? Os possíveis benefícios que já percebi incluem:

- Mais prazer, de vários tipos;

- Menos estresse  e ansiedade, e portanto maior calma e paz interior, resultado de melhor aceitação da situação atual (por exemplo, em viagens);

- Mais justiça na avaliação dos outros, de nós mesmos e dos comportamentos de todos. Você pode, por exemplo, encontrar novos tipos de beleza, como em outras raças. Se cria expectativas de crianças com base em comparações com padrões adultos, pode avaliá-las melhor usando padrões mais adequados a cada idade. Pode também ajustar as expectativas com relação às pessoas em geral para padrões mais realistas.

- Riqueza de visão do mundo. Você pode ter várias referências de comparação para a mesma situação. Isso também implica em mais flexibilidade e liberdade interior.

- Expansão da inteligência emocional. Note que, ao mudar uma referência de comparação, você pode mudar até a emoção que está sentindo.

- Mais auto-domínio e auto-liderança. Assumir a responsabilidade por suas referências de comparação lhe conduz a um maior controle da sua própria rédea.

- Melhor comunicação. Sabendo que outras pessoas fazem comparações, você pode, como nos casos acima, fornecer referências mais apropriadas para conseguir o que quer (se você vai usar esse recurso de maneira ética ou não é outra escolha sua!).

- Maior competência. Se você fica mais calmo, mais flexível, mais livre, mais auto-líder, com maior inteligência emocional e se comunica melhor, naturalmente se torna mais competente e eficaz no que faz.

Interferências

O sistema humano é complexo e, no caminho de mudanças, nem sempre previmos tudo. Listamos algumas interferências que você pode encontrar ao lidar com as comparações e alternativas para lidar com elas:

- Falta de hábito. Pode ser que você não esteja acostumado a prestar atenção no que faz internamente, o que é uma coisa boa no dia a dia, quando realmente deve predominar a busca de informações "lá fora" e a espontaneidade. Algumas coisas podem parecer estranhas, mas são só novas, e, após alguma prática, vem a familiaridade e a segurança.

- Rapidez devido a grande competência inconsciente. A dificuldade de identificar a referência de comparação advém da grande velocidade de execução do processo de pensamento. A solução é persistir, variando alguma coisa, como a pergunta. Estar em um estado relaxado também vai apoiar a busca, devido a um ciclo de percepção mais lento.

- Não-crença. Em geral, para fazermos algo, há uma crença na possibilidade de sermos capazes ou obtermos algum benefício. Se conscientemente você pressente alguma boa oprtunidade nas idéias acima, pode adotar a estratégia de agir "como se" fosse verdade ou como se fosse útil, só para testar melhor a idéia. Essa capacidade todos temos, uma vez que a treinamos desde crianças, brincando de faz-de-conta ou fantasiando.

- Pressa interna. Às vezes projetamos expectativas de resultados um pouco mais cedo do que seria realista para nossa capacidade atual. A solução é adequar as expectativas: a cada momento estamos fazendo o melhor que podemos.

- Desmotivação. Faz parte das nossas estratégias de decisão projetar o curso futuro dos acontecimentos. Pode ocorrer que você esteja projetando benefícios que acha que não valem a pena. Isso pode ser bom o bastante, e sua decisão é então apropriada. Mas se desconfia que sua projeção pode estar incompleta ou superficial, ou simplesmente para se certificar, você pode dedicar mais algum tempo a imaginar como seria um possível futuro em que você tenha amadurecido a habilidade de lidar com comparações.

Indo além

Há outras possibilidades de aperfeiçoamento de comparações. Você pode, por exemplo, entrar nos detalhes de como imagina o que compara (posição no espaço, luminosidade, tamanho) e alterar o tamanho do segmento dos objetos de comparação (mais genérico, mais específico: pessoa, rosto, olhos; cidade, local da cidade, o que fez no local). 

Você já deve saber que não há limites para o que se pode aprender; isso depende mais da sua vontade e de suas decisões sobre até onde vai e o que vai fazer com esse conhecimento e as habilidades dele resultantes.

Virgílio Vasconcelos Vilela

Colaborou: Sérgio Arruda, de Belo Horizonte/MG

Indique esta página para um amigo